Esse texto, foi o primeiro que eu fiz sobre uma experiência mediúnica. Foi ainda no início que eu começava a trabalhar com o Cipriano e ele havia pedido o seu cachimbo (depois de muito relutar meu, pois eu tinha "um acordo" de não fumar). Por solicitação dele, eu também fazia bolo de milho ( que na época era a única coisa que ele comia - acredito que para fazer com que eu realmente fizesse os bolos). Enfim, eu nunca adquiri muita habilidades na cozinha e o preparado sempre dava errado. Segue o texto:
Tudo começa com o processo de fazer um bolo: separar a clara da gema, bater as claras em neve, misturar a farinha, o açúcar, o fermento, levar ao forno e esperar que dê certo. Quando não a surpresa: o bolo não cresceu!
Quando trouxe o bolo para o terreiro, foram essas as palavras de um dirigente:
'O segredo é fazer com amor'.
A história segue o desenrolar com um cachimbo: branco, curvo e com a ponteira vermelha, inexperiência e orgulho do médium.
Após a gira começar e sentir a vibração do Preto, estar acomodado em um canto do terreiro, o ponto já estar riscado na tábua com a pemba branca, servir o seu café e cumprimentar os médiuns e entidades, era a hora de testar o novo instrumento de trabalho. Mas como fumar um cachimbo se eu nunca havia fumado? Em um momento, todos os olhos se voltam para o médium, o nervosismo atrapalha a vibração, as mãos começam a tremer e a suar, a fumaça do cachimbo não sobe com facilidade. Há algo errado.
A matéria assume o espiritual e na ânsia de mostrar firmeza, o orgulho toma conta.
Sim, pois ali já não era mais o preto que fumava, mas o médium que tentava imitar o que via os outros pretos fazerem ou seguir o manual que leu antes da gira de como fumar um cachimbo.
Segue novamente a história, são atendidos todos os consulentes e o espiritual decide inverter a história. Como se pegasse pela mão, o Preto decide ensinar seu modo de fumar e assim, longe de tantos olhares, sem a expectativa inicial e com um pouco mais de humildade a fumaça passa a subir. O preto demonstra que para não apagar o cachimbo, é necessário socar o fumo no fornilho mas, diferente dos outros médiuns, ele prefere usar o dedo. Depois é hora de ascender o cachimbo, com um isqueiro normal, aproximando o fogo do fumo e dando pequenas tragadas para que o calor se propague e o fumo queime uniformemente. Às vezes o cachimbo apaga, em outras, a fumaça que sai é pouca, às vezes nem é notada. Depois de fumado, basta limpar o cachimbo com aquelas ponteiras adequadas e está tudo terminado. Resta somente o preto do carvão nas mãos do médium e a sujeira nas calças.
Foi com a intenção do amor que foi levado o cachimbo e através daquela fumaça cheirosa se aprendeu uma lição: no momento da escolha do cachimbo e depois do fumo (um fumo de café, que o Preto gosta) sobre o amor. Se há na intenção o amor e o carinho, como podem médiuns proferir palavras que prejudicam ou machucam consulentes?
Se há na intenção o amor, como é possível os médiuns irem com a mentalidade de primeiro serem ajudados para depois ajudar? Não sabem eles que através do amor (aqui na forma de caridade) recebe a mais benéfica ajuda como um sorriso de agradecimento e seus problemas somem ou ainda, sua energia se equilibra.
Não através da mistificação de suas entidades, mas através do amor puro e simples. Como aquela historia da moça que ao chegar no terreiro deixou seus problemas em baixo da imagem de Ogum e após se doar mediunicamente, esqueceu até que os tinha colocado ali. Cofiante de que Ogum estivesse cuidando deles para ela.
Montando o cachimbo, aprendi que esses seres de luz, tem seu próprio modo assim como nós temos nossos gostos, escolhas e dificuldades. Que às vezes, muita pressão atrapalha assim como pouca pressão não fará com que o cachimbo permaneça aceso e se ele apagar é melhor acender várias vezes do que insistir em dar várias tragadas fortes, pois o calor poderá fazer com que o gosto do fumo se perca, ou seja, melhor insistirmos uma, duas, três vezes quantas forem necessárias e aproveitar esse momento do que simplesmente desistir. Tentamos de forma diferente.
Fumando, aprendi sobre as minhas expectativas e meu orgulho. Que muitas vezes, queremos que tudo dê certo, esperamos o reconhecimento sem o trabalho árduo e outras, queremos que a fumaça seja forte e branca para os olhos dos outros, quando na realidade o efeito não está na aparência, mas no prazer de fumar em si. Aprendi que é necessário um pouco de humildade e que a vaidade é só aquele carvão preto.

E como no ponto, meu segredo foi descoberto pela fumaça do cachimbo do Cipriano:
“ Eu tenho medo vovô, eu tenho medo, da fumaça do cachimbo descobrir o meu segredo”.
Saravá as Sete Linhas! Adorei as Almas! Agô meu Velho Cipriano! Laroyê Exú!